O que é o raccord?
Raccord é uma palavra de origem francesa que designa os elementos que são comuns a dois planos editados um a seguir ao outro. Em português Raccord pode ser designado por continuidade e em inglês designa-se por “continuity”.
Há continuidade quando há raccord entre dois planos, há descontinuidade quando há falhas de raccord.
O Raccord é por isso um termo que está relacionado com a Edição em continuidade que é designada em inglês por continuity editing.
A edição em continuidade baseia-se no conceito de Transparência que designa um objectivo máximo de quem produz um texto ficcional em que o leitor / espectador deve envolver-se com a narrativa e não ter nenhuma característica do texto que lhe desvie a atenção da narrativa.
A transparência é um conceito que é usado no âmbito do cinema e televisão e que tem alguma relação para o conceito de imersão que passou a ser usado no âmbito dos jogos vídeo.
Sempre que o texto chama a atenção do espectador para o discurso e o faz esquecer por momentos a história estamos perante uma falha de transparência.
A responsabilidade por manter a continuidade e evitar as falhas de raccord durante a gravação de um filme é do realizador do anotador(a) e na fase da edição, o responsável por manter a continuidade é o editor de imagem e de som. (PB)
“ Cohérence du contenu de l’ímage et/ou du son entre deux plans successifs. Par extension, personage raccord, objet raccord, effet lumineux ou sonore raccord, personage, objet ou effet que l´on retrouve dans la continuité du film” (Passek, 1995, vol II p.1775)
“racorder, c´est faire en sorte, comme le terme l´indique, que le cut ne soit pas ressenti comme une rupture définitive et radicale, mais comme l´occasion d´une Couture, qui permet d´assembler des morceaux différents avec la plus grande discrétion” (Amiel, 2001, p. 18)
Onde se verificam as falhas de Raccord?
As falhas de continuidade / falhas de Raccord podem estar relacionadas com imensos aspetos da construção do texto audiovisual. Abaixo estão alguns exemplos de descontinuidade:
spot tv – two hats para Smirnoff Mule – 1998
No vídeo Two Hats, em que é exemplificado de forma cómica quase todos os tipos possíveis de falhas de continuidade em apenas 30 segundos
A primeira falha de continuidade que existiu no cinema foi o Jump Cut que é o nome que se dá quando se junta um pedaço de um plano com ele próprio repetindo o mesmo ponto de vista e escala.
Vídeo John the manager tv spot cup a soup
Creative Director: Cor Den Boer * Copywriter: Diederick Koopal
Art Director: Cor Den Boer * Realizador: Yani
Video John the manager com slow motion
Acção repetida.
Outra forma de não respeitar a continuidade é quando se repete a acção em diferentes planos em vez de cada plano mostrar por ordem cronológica os diferentes aspectos de uma acção.
Cena de episódio do E2 repetição quotidiano sem sentido.
No entanto nos géneros televisivos de eventos em directo é frequente haver flashbacks de ações que já decorreram mostradas de diferentes pontos de vista e em slowmotion, como é por exemplo o caso da repetição de uma falta ou de um golo.(PB)
Falhas de continuidade no Cenário
Quando se mostram vários planos no mesmo cenário é necessário que de plano para plano o espaço se mantenha igual.
Falhas de continuidade na Roupa
Quando há vários planos dentro da mesma cena é necessário que os personagens mantenham a mesma roupa de plano para plano.
Quando os adereços manuseados pelos actores mudam
É muito difícil gravar e editar cenas com atores a beber, comer e fumar porque ao longo da gravação os objetos estão constantemente a ser alterados pelo que ao fazer um corte é habitual os adereços mudarem.
ver cena do croissant e da panqueca de Pretty Woman 1990
Falta de continuidade na Direção do olhar (regra dos 180 graus)
Falta de continuidade na Direcção do movimento e na direcção do olhar entre personagens (regra dos 180 graus)
Consultar aqui o documento sobre esta regra.
Falta de continuidade no Movimento
vídeo TV cabo (Raccord movimento)
Falta de Continuidade no Som
Cena do video institucional da CerciOeiras com som directo
Existem cenas de filmes em que a continuidade é feita essencialmente pela banda sonora porque as imagens não têm qualquer tipo de continuidade entre si.
Vejam este exemplo no filme CONVERSAS DE BAIRRO da produtora vende-se filmes 2013 para a Padaria Portuguesa
Porque é que existem falhas de Raccord?
Os textos audiovisuais são gravados só com uma câmara em descontinuidade de tempo e espaço, mas quando se expõe uma narrativa é suposto o espectador não detectar a descontinuidade que houve no acto da gravação dos planos. (PB)
Como é possível juntar planos sem descontinuidade?
Respeitar algumas regras de estilo que condicionam a planificação, enquadramentos e montagem como seja
Regra dos 180 graus
Regra dos 30 graus
Fazer a ligação de planos com objectos que fazem o mesmo movimento no plano que termina e no plano que começa
Não montar panorâmicas ou travelling em sentidos contrários.
Não colar planos em movimento com planos fixos e vice-versa.
Não colar dois planos do mesmo objecto ou pessoa com a mesma escala, mesmo que o ponto de vista seja diferente.
Fazer coincidir no ecrã o ponto de interesse do plano que termina com o ponto de interesse do plano que começa.
Não fazer o corte das bandas de imagem e som em simultâneo (usar o split, pontes e fades) (PB)
É possível usar deliberadamente a falha de Raccord?
A falha de raccord é aceitavel quando estamos num contexto de montage sequence, ou num filme baseado na montagem como foi desenvolvido pelo cinema sovietivo no inicio do século XX.
Quando o desrespeito da continuidade contribui para a exposição da informação é criativo e aceitável. Vejamos alguns exemplos: (PB)
Wolkswagen Beetle commercial – VW Bubble Boy
Vídeo 80 repetição quotidiano
Don Shelford – Art Director, Joe Fallon -Writer, Mike Mills – Director
agência Arnold Worldwide
msica mr. blue Sky” da Electric Light Orchestra
Neste Vídeo pretende-se mostrar a rotina, a repetição diária de gestos, a monotonia da vida deste funcionário de escritórios, por isso a planificação e edição decisão quebrar as regras dos 30 graus, colar planos com o mesmo ponto de vista e mesma escala mas em dias diferentes e cortar movimentos de camara a meio com outros movimentos de camara com a mesma escala e ponto de vista não para chamar a atenção do discurso nem para desviar a atenção da mensagem mas pelo contrário para fazer ver ao espectador o conceito de quotidiano monótono que no fim vai ser quebrado pelo novo carro. (PB)
Apocalypse Now, 1979, Francis Ford Coppola, Editor da cena inicial Walter Murch
Cena inicial de apocalipse now.
Neste artigo Walter Murch explica em que circunstâncias foi filmada a cena com o actor Martin Sheen no quarto de hotel e como surgio a ideia de editar esta cena no inicio do filme (Murch, 2016)
The Fog of War de Errol Morris
Vídeo 240 mcnamara em depoimentos
Excerto de uma entrevista com Errol Morris
Tom Ryan: And you repeatedly use jump cuts and black leader to interrupt what otherwise might have been smoothly flowing interviews.
EM: …I have always edited my interviews heavily. To me there’s a kind of internal music to monologue. In this particular instance, I chose to show the edits. Often I hide them by burying them under various kinds of visual material. In this case you actually see the edits. I’ve never really done it before. I just somehow like the idea. And I like the idea that we see McNamara from all of these different vantage points: he’s here, he’s there, he’s everywhere.
Entrevista com Errol Morris “Making History: Errol Morris, Robert McNamara and The Fog of War” http://sensesofcinema.com/2004/politics-and-the-documentary/errol_morris_interview/
Referências
Passek, J.-L. 1995. Dictionnaire du Cinema. Paris: Larousse.
Amiel, Vicent. 2007, Esthétique du montage, Armand Colin. Da página 18 a 23
Errol Morris, 2004, entrevista Tom Ryan a Errol Morris “Making History: Errol Morris, Robert McNamara and The Fog of War” http://sensesofcinema.com/2004/politics-and-the-documentary/errol_morris_interview/
Murch, Walter. 2016, entrevista na revista CINEMONTAGE JOURNAL OF THE MOTION PICTURE EDITORS GUILD VOL 5 Nº1 q1 2016 Winter 2016_
spot tv – two hats para Smirnoff Mule – vídeo 82
IDV – TWO HATS Alcoholic Drinks IDV Advertising Agency:LOWE HOWARD-SPINK UNITED KINGDOM Creative Director:PAUL WEINBERGER Copywriter:PAUL SILBURN Art Director:VINCE SQUIBB Agency Producer:CLAIRE TAYLOR Production Company:COWBOY FILMS UNITED KINGDOM Director:MARK STORY Producer:AMANDA WILLGRAVE Music: Artist/Title:PAUL HART/JOE CAMPBELL
In this pastiche of a forties thriller a bottle of Smirnoff Mule sparks off a chain of ridiculous continuity errors (the PI acquires flippers; the blonde changes shape …). Smirnoff Mule: mixed in Hollywood since the forties. TWO HATS | 1998 | Bronze Lion
ESCS, magazine E2
Vídeo 87 repetição quotidiano de forma errada
vídeo 86 tv cabo (Raccord movimento)
Vídeo 81 john the manager + 81 john the manager com slow motion
Advertising Agency:Ammirati Puris Lintas, Netherlands
Advertising Agency:Hazazah Film, Netherlands
Creative Director:Cor Den Boer
Copywriter:Diederick Koopal
Art Director:Cor Den Boer
Agency Producer:Roosemarie Praaning
Account Supervisor:Simon Neefjes
Advertiser’s Supervisor:Marnix Eikenboom
Director:Yani
Producer:Lex Szantoo
Lighting Cameraman:Menno Westerdorp
Music:Klaas Berings – Vonk Sound
Pretty Woman 1990 de Garry Marshall cena do pequeno almoço
CerciOeiras, vídeo institucional, 2015, Barbosa, Paulo. ESCS
vídeo 64 Raccord de som
vídeo 84 Bicicletas (procurar outro exemplo)
Volkswagen Beetle commercial – VW Bubble Boy
Vídeo 80 repetição quotidiano
Don Shelford – Art Director, Joe Fallon -Writer, Mike Mills – Director
agência Arnold Worldwide
musica mr. blue Sky” da Electric Light Orchestra
Apocalypse Now, 1979, Francis Ford Coppola, Editor Walter Murch
Vídeo 401 cena inicial de apocalipse now
The Fog of War, 2003, Errol Morris, 2003,
video 240 jump cut com mcnamara em depoimentos